Questionaram-me: por que expões a Ponte? Porque considero necessário compartilhar com outros professores as grandezas e as misérias da nossa profissão, o que dizer de Miguel Guerra, é "um modo de reavivar o compromisso com as pessoas e com a ação educativa, que consiste em ajudá-las a ser mais felizes". O conhecimento das experiências vividas na Ponte poderá ajudar os professores a ultrapassar decepções.
Como diria Lorraine Moureau, um terço dos professores é muito bom, um terço pode ficar bom, um terço deve abandonar a profissão. Chamemos aos primeiros aquilo que são: professores. Designemos os segundos por quase-professores. Os outros serão "os outros".
Um professor contou-me o sucedido numa reunião do conselho pedagógico, quando propôs que se alargasse a toda escola um projeto que dera ótimos resultados no seu departamento. O terço dos professores apoiou. O terço dos quase-professores quedou-se num silêncio expectante. Os "outros" pronunciaram-se: "Ó colega, se isso der bons resultados, poderá ter de se estender ao resto da escola. E nós sabemos que isso dá trabalho." Na votação, os quase-professores aliaram-se aos "outros", e o projeto foi inviabilizado.
Apesar de a Ponte ter conquistado o direito de escolher os seus professores, alguns "outros" conseguiram introduzir-se na escola. Instalaram-se, enquistaram-se, degradaram o sistema de relações, fomentaram o aparecimento de guetos, espalharam insinuações com que conseguiram deteriorar laços afetivos. Assumiram atitudes contrárias ao exercício da autonomia, da solidariedade e da responsabilidade, fragilizando esses esteios da cultura da escola. Tiveram tempo para explorar a insegurança dos quase-professores e de os manipular. Criaram o cenário ideal para destruir a imagem dos professores mais conscientes e leais ao projeto. As reuniões foram colonizadas por assuntos de natureza administrativa, esvaziando-se de pedagogia.
A Ponte avisa os que são professores. E já há séculos Pestalozzi os avisava: "Não sonhes com uma obra acabada. Momentos de extrema elevação se alternam com horas de desordem, de desgostos e de preocupações".
Ao longo de dezenas de anos, conheci professores que acreditaram nas boas intenções dos poderes e na solidariedade dos seus pares de profissão. Vi esses professores fazerem maravilhas com os seus alunos, acreditando ser possível melhorar as escolas. Assisti às suas tentativas de sensibilização dos quase-professores. Vi os seus projetos serem destruídos pelo cinismo e a maldade dos "outros". Vi as suas vidas serem destruídas.
                                                                 Nos debates públicos, predomina a tendência                          "politicamente correta" de ocultar a existência do que                          Lorraine Moureau designou pelo terço de professores que                          deve mudar de profissão. Pero que los hay, los hay...                          E serão, talvez os maiores responsáveis pela degradação                          do estatuto da nobre profissão de professor e pela                          obsolescência da escola.
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                         *Especialista em Música e em Leitura e Escrita, José                          Pacheco, de 52 anos, coordena desde 1976 a Escola da                          Ponte, instituição pública que se notabilizou pelo                          projeto educativo inovador, baseado na autonomia dos                          estudantes. O educador português, que se diz "um louco                          com noções de prática", é mestre em Ciências da Educação                          pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação                          da Universidade do Porto. 
 
 
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